SUICÍDIO DE IDOSOS: SOFRIMENTO FAMILIAR E PREVENÇÃO

Para apresentar e discutir os resultados da pesquisa É possível prevenir a antecipação do fim? Suicídio de idosos no Brasil e possibilidade de atuação do setor saúde, o Centro Latino-Americano de Estudos de Violência e Saúde Jorge Careli (Claves/ENSP) realizou o I Seminário Nacional sobre Prevenção de Suicídio de Pessoas Idosas. Durante os três dias de atividades, os participantes debateram, entre outros temas, visão epidemiológica sobre o suicídio de idosos, perspectiva de gênero em relação ao suicídio, o impacto do ato suicida na família, fatores de risco e prevenção de suicídio de idosos. Confira na Biblioteca Multimídia da ENSP as apresentações do seminário.

“Este seminário nos fez refletir sobre um tema que atravessa várias áreas disciplinares e foi tratado por meio de uma pesquisa realizada no período de dois anos e financiada pelo programa Inova-ENSP, que incentiva e apoia investigações de temas novos que possam contribuir, estrategicamente, para o avanço da saúde pública”, destacou a coordenadora da pesquisa, Cecília Minayo. A pesquisa de âmbito nacional deu origem ao volume 17, número 8 da Revista Ciência e Saúde Coletiva, com diversos artigos sobre o suicídio de idosos no Brasil.



Na ocasião, Ana Elisa Bastos Figueiredo, pesquisadora do Claves e participante do estudo, ressaltou que o suicídio não ocorre em uma relação lateral, e sim sempre numa relação bilateral. Ana Elisa é autora, com Raimunda Magalhães da Silva, professora da Universidade de Fortaleza (Unifor), do artigo intitulado "O impacto do suicídio da pessoa idosa em suas famílias". Elas apontaram que o suicídio tem consequências impactantes nos grupos sociais mais próximos das pessoas que cometem o ato suicida, nesse caso o grupo familiar. “O caso de suicídio é uma realidade da qual ninguém sai ileso, além da família, todos que estão em volta sofrem.” Para explicar a relação de sofrimento das famílias, as pesquisadoras citaram o cruzamento entre a dinâmica e a estrutura familiar, procurando buscar como as famílias entendem o ato suicida.

O conceito de dinâmica familiar foi explicado como as condutas e ações sustentadas em uma normatividade estabelecida, que permeiam a vida cotidiana dos membros de um grupo. O padrão organizado dentro do qual os membros da família interagem é visto como a estrutura familiar. Elas explicaram ainda a trajetória metodológica do estudo de âmbito nacional que teve abordagem qualitativa. Ana Elisa e Raimunda apresentaram histórias contadas pelos familiares dos idosos e ressaltaram a importância de compreender a atmosfera em que ocorreu o ato suicida e mostrar as fraturas que ficam entre os familiares.



Foram entrevistadas cerca de 50 famílias que possuíam desde nível superior a nenhum grau de escolaridade, residentes da zona rural ou procedentes dela, de diversas religiões, com predomínio da católica, e os mais diversos níveis de ocupação, desde servidores públicos, agricultores e autônomos a vendedor ambulante e trabalhadores rurais. No estudo, foram apresentados ainda os núcleos de sentido, que dizem respeito ao que fica para as famílias. Cinco descritores foram apontados nos núcleos de sentido: sentimento de culpa pelo ato suicida do familiar idoso; isolamento social e suas manifestações na saúde; estigma, preconceito social e crença na improbabilidade do ato; raiva e sofrimento familiar; e superação e atenção aos familiares.

Outro ponto explorado pela pesquisa foi em relação à atenção do setor saúde para esses casos. De acordo com dados citados no artigo, 67% ou mais de idosos que cometeram suicídio estavam em atendimento em serviços de atenção primária nos últimos 30 dias de vida e até meia semana antes de cometerem o ato. Por fim, as pesquisadoras afirmaram que é preciso intensificar programas de atenção ao idoso e seus familiares no sistema de saúde e fortalecer os programas sociais e psicológicos entre os familiares. “Capacitar profissionais em todos os níveis de atenção, principalmente na atenção básica, para dar suporte aos idosos e suas famílias e desvelar o mito do suicídio entre os diversos atores que mantêm vínculo com o idoso são ações muito importantes no combate ao suicídio”, concluíram.

Para debater o artigo "Autópsia psicológica e psicossocial sobre suicídio de idosos: abordagem metodológica", Fátima Gonçalves Cavalcante, professora da Universidade Veiga de Almeida e também coordenadora da pesquisa É possível prevenir a antecipação do fim?, esteve presente no evento. Fátima explicou que a autópsia psicológica é um tipo de estudo retrospectivo que reconstitui o status da saúde física e mental e as circunstanciais sociais das pessoas que se suicidaram, a partir de entrevistas com familiares e informantes próximos às vítimas. O objetivo da apresentação da professora foi apresentar a metodologia de autópsia psicológica e psicossocial, além de expor os primeiros recortes que o estudo produziu.

De acordo com a professora, a maior parte das famílias quer conversar sobre o suicídio. Por isso, é muito importante abrir espaços de escuta, ressaltando a atuação dos profissionais de saúde, para beneficiar as famílias. Em seguida, a professora citou que o ponto forte da autópsia psicológica e psicossocial está na contextualização dos dados da história psicológica e psicossocial das pessoas estudadas e na possibilidade de se mostrar uma série de circunstâncias e nuances que grandes estudos epidemiológicos ou populacionais não conseguem apontar. Por fim, Fátima apresentou os formatos de entrevista, a construção dos roteiros, ficha de identificação e genograma.



Fatores de risco, prática e teoria da prevenção e experiência exitosa

O último de dia do seminário abordou os fatores de risco e a prevenção de suicídio de idosos, e a prática e a produção de conhecimento sobre a prevenção de suicídio. Também apresentou a experiência exitosa do caso de Candelária, no Rio Grande do Sul. "Fatores de Risco e Prevenção de Suicídio de Idosos" foi o tema do artigo escrito pelo médico da Sociedade Cubana de Psiquiatria Sergio Perez. Segundo ele, os fatores de risco são aqueles que facilitam o surgimento ou desenvolvimento de um estado mórbido; no caso de suicídio, são aqueles que aumentam, facilitam ou promovem a ocorrência do ato suicida.



Em sua exposição, o médico descreveu os fatores de risco para o suicídio em idosos, entre os quais estão a depressão, o abuso e os fatores médicos, psicológicos e sociais. De acordo com Perez, os fatores de risco possuem as seguintes características: individuais, genéricos, historicamente determinados, associados a cultura e geracionais. Além disso, existem os fatores de risco pessoais, familiares e socioambientais. Sergio Perez ofereceu ainda um guia prático para avaliar o risco de suicídio em idosos.

Em seguida, Marta Conte, também pesquisadora do estudo, apresentou a prática e a produção de conhecimento sobre a prevenção de suicídio de idosos. Segundo Marta, nas teorias de prevenção, as orientações da Organização Mundial da Saúde (OMS) são, em linhas gerais, quanto à identificação do problema, às abordagens, às formas de comunicação fatos e ficção, às articulações de retaguarda e às formas de encaminhamento. No entanto, essa não é a realidade do cotidiano na relação entre o profissional de saúde e o paciente.


De acordo com Marta Conte, a rede de saúde deve ser vista como um local de conexão envolvendo o sujeito idoso na linha de cuidado (desenha o itinerário que o usuário faz por dentro de uma rede de saúde). Em seguida, Marta falou das condições para acolhimento na linha de cuidado, com destaque para a hospitalidade. “É preciso considerar o que é risco para cada um e como exercer o autocuidado, construindo, a partir daí, estratégias para isso. Apenas agir com flexibilidade não suprime o estabelecimento de algumas combinações”, afirmou.

Finalizando as exposições, a coordenadora do Centro de Atenção Psicossocial (CAP) de Candelária, Rio Grande do Sul, Aline Trindade, apresentou dados da experiência exitosa do CAP. Inicialmente, Aline contextualizou o problema. De acordo com ela, estima-se que anualmente 1 milhão de pessoas no mundo cometem suicídio, são cerca de dez tentativas para cada suicídio consumado. A cada 40 segundos, uma pessoa comete suicídio no mundo e, a cada quatro segundos, alguém tenta contra a própria vida no mundo. “O Rio Grande do Sul é o estado brasileiro com maior percentual de suicídios. "A cada dia, três pessoas se matam no estado. Para cada morte, 30 tentativas ocorrem”, advertiu.



Em seguida, Aline falou sobre o Programa de Prevenção ao Suicídio, que reduziu significativamente os números de suicídios na região. De acordo com a coordenadora, as estratégias de prevenção do Programa foram baseadas na estruturação dos profissionais envolvidos nas oficinas; na prioridade do grupo de risco, ou seja, pacientes com tentativas de suicídio; na sensibilização da rede sobre a realidade do município e aplicação de ações de prevenção; e na capacitação de profissionais e locais envolvidos.

Aline afirmou também que, mesmo com a avaliação e o tratamento adequado, os suicídios ocorrem e causam forte impacto sobre os profissionais envolvidos. “O objetivo do trabalho de prevenção é obter um bom índice dentro dos padrões epidemiológicos. É preciso sempre aplicar ações que facilitem o programa identificando e tratando transtornos mentais, por exemplo, conversando francamente sobre o assunto e acompanhando adequadamente pacientes que já tiveram tentativas de suicídio”, finalizou.

Tatiane Vargas 
A partir do Informe ENPS Fiocruz. Leia no original

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Um comentário :

  1. Anônimo11/9/12

    Lindo o texto! Mas a verdade é que a velhice é uma tristeza! TODO idoso sabe disso! A velhice é uma indignidade, na maioria dos casos! Respeito os idosos, mas considero a velhice uma das maiores tristezas da humanidade. Não quero ficar velho! Prefiro morrer jovem! O velho, na mioria das vezes, fica dependente, perde a autonomia e, se não deseja viver, tem todo o direito de morrer (ainda que seja pelo suicídio). Bonito falar de idoso, como uma coisa linda, para quem nunca ficou idoso, para quem não tem derramme, alzaimer, parkison, etc.

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