Suicídio é terceira causa que mais mata jovens no país, atrás apenas das drogas e trânsito |
Uma classe vazia atormenta alunos de uma escola estadual de
Imbé, litoral do Rio Grande do Sul. Quem convivia com a aluna mais
popular do colégio hoje se angustia com a ausência. A menina, de 15
anos, foi encontrada morta em seu quarto em julho deste ano. A conclusão
da perícia: suicídio.
A 700 km da cidade gaúcha, uma escola particular de Curitiba (PR)
sofre com a mesma ferida, aberta dois anos atrás, quando uma estudante
de 16 anos tirou a própria vida dentro do ambiente escolar. Em ambas as
instituições, o procedimento oficial foi o mesmo: suspensão das aulas
por luto no dia seguinte e, depois, ninguém toca mais no assunto.
Essa atitude dos colégios, contudo, tem que mudar. É o que defende a
psicóloga clínica Célia Maria Ferreira da Silva Teixeira, que no seu
doutorado em educação defendeu a tese A Escola Como Espaço de Prevenção ao Suicídio de Adolescentes.
Segundo ela, mais do que o tema morte, o suicídio é um tabu para todos
os setores da sociedade, inclusive nas escolas, que deveriam ser
parceiras nesse combate. "Pelo contrário, as escolas ignoram", diz.
O suicídio é a terceira causa que mais mata jovens no Brasil,
perdendo somente para drogas e acidente de trânsito. Ao lado da velhice,
a juventude é a fase da vida de maior ocorrência. Em 2009, segundo
dados do Ministério da Saúde, 2.775 pessoas de 15 a 29 anos foram
responsáveis pela própria morte. Uma preocupante marca que fez com que o
dia 10 de setembro fosse declarado Dia Mundial de Prevenção ao
Suicídio.
Para os colegas das duas adolescentes citadas no início da
reportagem, os números não dão conta de sentimentos como medo, raiva e
culpa que afloram no meio. Célia explica que a maioria das instituições
optam por "não tocar mais no assunto" pelo simples fato de não saber
como lidar. "O certo seria conversar com os estudantes sobre o ocorrido,
e deixar que eles falem o que pensam, o que sentem", diz. "Não falar
sobre isso em sala de aula faz com que o local de desabafo seja no
recreio, sem acompanhamento pedagógico", completa.
Professores precisam estar atentos a sinais
A psicóloga defende que as escolas estejam preparadas para "remediar", mas acima de tudo para "prevenir" casos de suicídio. Para ela, sendo o colégio uma instituição voltada à formação de seres humanos, um dos papéis do professor deveria ser a capacidade de identificar alunos que apresentam fatores de risco. Ela explica que os sinais de alerta podem vir com frases como "não aguento mais" ou mesmo as mais diretas, como "quero me matar". O afastamento dos amigos, o baixo rendimento escolar e a melancolia são outros indicadores.
A psicóloga afirma que é preciso estar atento à tendência, ao
pensamento e a tentativas suicidas. "Os pensamentos antecedem a ação.
Nesse momento, a pessoa emite sinais para os que estão por perto. É um
pedido de ajuda", diz.
Ao trabalhar focando a prevenção, os professores não precisam falar
sobre o suicídio diretamente, diz a psicóloga, mas podem criar um espaço
para que os jovens falem sobre os seus sentimentos. São nesses
momentos, explica, que os fatores de risco se apresentam. Além disso, o
fato de o aluno ver na escola um local de compreensão e carinho pode
evitar o ato.
"Muitas vezes este jovem está estressado pela cobrança escolar, com
problemas familiares e sofrendo discriminação dos colegas. E além de
tudo isso, não tem lugar nenhum para extravasar a sua angústia. Os
colégios deveriam proporcionar isso para ele", defende.
Identificados os sinais de risco, passa-se para uma fase ainda mais
desafiadora: o que fazer a seguir? Para Célia, que ministra aulas para
orientar profissionais da saúde e da educação sobre o tema e é chamada
por escolas quando acontecem casos de suicídio, a maioria dos
profissionais sofre de desinformação, mas principalmente apresenta uma
postura de descaso.
Em uma das reuniões com professores de um adolescente que se matou,
ao explicar os sinais de risco, ouviu dos mesmos que eles haviam
percebido tais comportamentos no aluno, mas que não tomaram nenhuma
atitude. "Não é por mal. O que acontece é que os adultos tendem a olhar o
adolescente como um dramático, um rebelde sem causa. Então, qualquer
comentário suicida é visto como puro drama", diz, completando que os
jovens têm ainda outra característica mais crucial: a impulsividade. ¿É
por isso que o ato de tirar a própria vida acaba sendo recorrente nesta
faixa etária", observa.
Junto à impulsividade estão o que se chama de "três D": desesperança,
desamparo e depressão. Na adolescência, esses sentimentos são
ocasionados, na maioria das vezes, por problemas familiares, falta de
amigos, não conhecimento de si próprio e extrema exigência de
desempenho. "Eles têm que ser bonitos, populares, inteligentes, queridos
e constantemente felizes", explica. "A escola deveria ser o porto
seguro do estudante, mas ela está sendo outro fator de risco. Lá o aluno
encontra cobrança, falta de compreensão e o bullying", conclui a
psicóloga.
Políticas antibullying nas escolas diminuem casos
Se para adolescentes a alternativa do suicídio ronda seus pensamentos com mais frequência do que nos adultos, para aqueles que são gays, lésbicas ou bissexuais o risco é cinco vezes maior. É isso que mostra a pesquisa liderada por Mark Hatzenbuehler, da Universidade de Columbia, nos Estados Unidos, divulgada neste ano. O estudo ainda provou que políticas antibullying em ambiente escolar podem diminuir este índice.
Se para adolescentes a alternativa do suicídio ronda seus pensamentos com mais frequência do que nos adultos, para aqueles que são gays, lésbicas ou bissexuais o risco é cinco vezes maior. É isso que mostra a pesquisa liderada por Mark Hatzenbuehler, da Universidade de Columbia, nos Estados Unidos, divulgada neste ano. O estudo ainda provou que políticas antibullying em ambiente escolar podem diminuir este índice.
Os pesquisadores entrevistaram mais de 30 mil alunos de High School, o
Ensino Médio norte-americano, em 11 diferentes municípios no estado do
Oregon (EUA). Eles concluíram que cerca de 20% dos adolescentes gays ou
bissexuais haviam realizado tentativas suicidas um ano antes da
pesquisa. Entre os heterossexuais, o número cai para 4%.
Ao analisar o ambiente escolar em que estes jovens estão inseridos,
os pesquisadores detectaram que a presença de políticas
antidiscriminação na sala de aula diminui em 25% a probabilidade de um
homossexual cometer suicídio. O fato também tem consequências nos
heterossexuais, que passam a ter 9% menos chances de tirar a própria
vida.
"Quando a comunidade oferece apoio ao jovem gay, e as escolas adotam
políticas antidiscriminação que protegem esses adolescentes
especificamente, o risco de tentativa de suicídio cai para todos os
jovens, especialmente para os GLB", disse Hatzenbueheler ao site LiveScience.
A partir do Portal Terra. Leia no original
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