Para retratar ainda melhor a ideia de que tudo acontece rápido quando alguém muda de humor, o livro foi desenhado como um flipbook, ou folioscópio, que é quando as imagens parecem ganhar movimento ao ser folheadas.
Ninguém sabe dizer por que o menino do livro está chorando. “Sensações são coisas muito pessoais. A gente sabe que existe até choro de felicidade.”
“Todas as emoções que a gente sente merecem existir, não tem nenhuma que precisa ser tirada da roda”, promete o psicanalista Christian.
"Eu era um menino tempestade”, lembra Yuri. Ele conta que, quando criança, chorava muito, e alto. “Na adolescência tinha mais dificuldade para chorar. Acho que dei uma segurada nas emoções”, diz.
“Escrevi o livro para falar para as crianças que chorar é bom e é transformador, seja pelo motivo que for.”
Quando pequeno, o ilustrador Renato Moriconi era melancólico. Ele conta que até se relacionava, e gostava de fazer as pessoas rirem, mas que também sentia esta melancolia, que é como uma tristeza sem motivo concreto.
“Eu estudava em uma escola que ficava em frente ao prédio onde minha mãe trabalhava. Ela era minha heroína, me criou sozinha. E, no recreio, as crianças ficavam brincando, enquanto eu ficava deitado na gangorra olhando para o prédio dela”, lembra.
O músico e escritor americano David Ouimet publicou recentemente “Eu Fico em Silêncio” (Companhia das Letrinhas, 56 páginas, R$ 54,90), um livro sobre uma menina que não se sente compreendida pelos outros, e acha que não se encaixa no mundo.
“Sinto que não há livros infantis suficientes sobre as emoções desconfortáveis que todos nós sentimos”, explica David. “Se pudermos falar sobre estas coisas, podemos vê-las mais claramente e entender que estar triste, solitário ou assustado são sentimentos que todas as pessoas têm.”
Na história, a protagonista é uma menina que algumas vezes usa uma máscara, e que, por todos os lugares onde passa, seja na escola ou andando pelas ruas, se acha deslocada.
“Ela está ansiosa. Sente que todos estão falando sobre ela, e se sente pequena”, conta.
"A garota no centro do livro está muito perdida em seu próprio mundo. Ela parece diferente, fala de forma diferente. Como resultado, ela simplesmente escolhe ficar quieta. Eu acredito que são emoções que todos nós experimentamos ao crescer, e até mesmo quando somos adultos”, completa o escritor.
David conta que foi uma criança muito parecida com a menina de “Eu Fico em Silêncio”. “Eu era perdido em meu próprio mundo. Foi isso que me fez ser quem eu sou hoje, um autor, artista e músico. Foi como encontrei minha voz.”
“É muito importante a gente descobrir e respeitar quando quer ficar quieto”, ensina o psicanalista Christian. “Às vezes a gente quer inspecionar o que tem dentro do armário da nossa cabeça, sem dar satisfação para os outros.”
“Já reparou que os adultos não dão satisfação pra gente?”, questiona. “Mas eles querem saber da gente, e isso é chato. Porque às vezes eles perguntam e a gente não sabe responder. E, outras vezes, a gente diz uma coisa e eles escutam outra, e isso é terrível.”
Christian diz que, quando parece que ninguém acha a palavra certa para conversar, e tudo que se diz gera mais confusão e incompreensão, é normal ter vontade de “entrar no buraco”.
“E está muito certo fazer uma pausa. Vai para a sua estação de tratamento de pensamentos e emoções, mas volta o quanto antes. Pede desculpas. Isso pode ser meio chato, mas é o melhor caminho. Porque os outros não estão lendo a nossa cabeça, e a gente não está lendo a cabeça dos outros.”
A partir da Folha de S.Paulo