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FILME FRANCÊS TRATA COM LEVEZA A DEPRESSÃO

3/27/2015

Mais do que falar sobre a depressão, o diretor Pierre Salvadori (de “Uma Doce Mentira”, 2010), que assina também o roteiro, mostra a crueza de uma crise que envolve seus protagonistas em “Um Pátio de Paris”.

Ele desenvolveu personagens que vivem à deriva, cujas perspectivas lhes foram roubadas, não apenas pela doença em si, mas por recusa de seus círculos íntimos de entender o que realmente ocorre. O filme estreia em São Paulo, Rio de Janeiro e Brasília.O primeiro, e o mais performático, é o músico Antoine (Gustave Kervern), que deixa carreira, esposa e literalmente o palco, para trabalhar como zelador de um condomínio parisiense. Afeito a bebidas e drogas (único meio que lhe permite dialogar com outras pessoas), vê ali uma oportunidade de se entregar aos poucos a um inevitável fim.

No entanto, lá conhece a aposentada septuagenária Mathilde (Catherine Deneuve), que começa, passo a passo, a perder a noção de realidade. Um trabalho, aliás, brilhante da atriz, que se entrega ao papel, mesmo perdendo sua aura de realeza francesa, como o fez em “Ela Vai” (em 2013). Tragicamente perdido em seus devaneios, seu marido Serge (Féodor Atkine) não percebe o gradativo estado depressivo ao qual ela se encaminha.

Como se a torta relação entre Antoine e Mathilde não bastasse, Salvadori ainda coloca no caminho Stéphane (Pio Marmaï), um ex-atleta, que vive enfurnado em seu apartamento consumindo heroína e outras drogas, saindo ocasionalmente para roubar bicicletas. O trio, aparentemente trivial, consome a si, tendo Antoine, que nunca consegue dizer não, como ponte.

Apoiado em seu elenco afinado, o diretor evita carregar demais nas dores de seus protagonistas, incluindo aí doses ocasionais de humor para abarcar de maneira leve o tema. Mesmo assim, não se trata de uma história de superação, mas sim uma bem-pensada, tecnicamente, forma de assimilação do que é a depressão, com estágios, sintomas e enfrentamentos muito diferentes.

Em determinado momento, Antoine (percebendo que há algo de errado com sua amiga) diz que precisa falar algo para ela, mas não sabe como. Na cena em que ela segura sua mão, entendendo a ele e a si mesma, Salvadori mostra uma sensibilidade social, tão marcante como a grandeza cênica, de quem pensa através de imagens e metáforas. É, enfim, um forte pensamento figurativo, comovente e, até, útil.

A partir do G1. Leia no original

'EU TINHA UM CACHORRO PRETO. SEU NOME ERA DEPRESSÃO'

3/23/2015


"Depressão é frescura!"

Esta é uma afirmação totalmente distante da realidade. Entre outras "explicações" para a depressão, também são atribuídos a preguiça, corpo mole, e até "falta de pegar no batente". 

Nada poderia estar mais longe da verdade: a depressão é um dos grandes tópicos de atenção da Organização Mundial de Saúde (OMS). Segundo estatísticas constatadas pela OMS, a depressão é uma psicopatologia que aflige mais de 350 milhões de pessoas no mundo inteiro. Dessas, menos da metade recebe ou já recebeu alguma espécie de tratamento para a doença. Podemos imaginar que o preconceito de que "depressão é frescura" é em parte responsável pela ausência de tratamento de tantas pessoas em necessidade. De fato, a depressão tem tamanha importância e urgência de tratamento a ponto de projeções feitas pela OMS indicarem-na como a possível doença mais comum (entre todas as doenças existentes) a partir do ano de 2030. 

Existem vários tratamentos efetivos para a doença, sendo a psicoterapia um deles. Apenas assumir (para si próprio e para um outro alguém) a existência do problema e a necessidade de lidar com ele já pode iniciar um efeito transformador. Se você ou alguém próximo a você sofre de depressão, procure ajuda profissional. Esse pode ser o primeiro passo em direção a uma grande mudança.

FONTE: http://www.who.int/mediacentre/factsheets/fs369/en/index.html

ENSAIO COM SIMULAÇÕES DE SUICÍDIO É CRITICADO

7/18/2013

As revistas de moda frequentemente abusam de temas polêmicos par ilustrarem seus ensaios fotográficos. Por mais que algumas fotos chamem a atenção para causas sociais importantes – como a marca italiana Benneton, que já foi alvo de críticas e elogios por com temas como desigualdade social, racismo e AIDS em seus ensaios – não se deve esquecer que o objetivo original de uma campanha publicitária de moda é vender roupas. Além disso, as marcas acabam vendendo também uma imagem a ser seguida, um padrão social e um estilo de vida, e a maioria dos consumidores acabam seguindo esses padrões inconscientemente. Seguem a “filosofia” da marca; e compram não só uma roupa, mas o que ela representa, achando que assim passará também a representar tal coisa.

Isso pode ser extremamente perigoso, pois os consumidores são muitas vezes influenciados a ter certos tipos de comportamento seguindo o que a marca propõe, sem realmente perceber se concordam ou não com isso. Um exemplo claro disso é a quantidade de meninas – e meninos também, em menor proporção – com distúrbios alimentares como anorexia e bulimia ter aumentado depois do padrão de beleza das modelos e atrizes ter passado a ser a magreza extrema. Muitas das modelos são bastante magras por um fator genético, mas, querendo copiar sua natureza, a maioria passou a apresentar obsessão por perder quilos – e isso foi passado para os jovens por ser considerado o certo dentro e o dentro do padrão.

E é por causa dessa grande influência que a mídia possui na formação de opinião, principalmente de jovens, que a edição americana da revista Vice foi tão criticada ao lançar o ensaio “Last Words”. A publicação simulava o momento de morte de importantes escritoras com algo em comum: todas tinham se suicidado. Amplamente criticado por blogs, leitores, organizações anti-suicidas e grupos em prol da saúde mental, as críticas acerca da publicação talvez tivessem sido menores se, junto com as fotos, fosse inserida ao menos uma nota sobre a autora, uma análise sobre sua obra ou qualquer outra coisa que no mínimo mostrasse um mínimo de consideração com sua contribuição literária. Ao contrário disso, o foco da legenda foi o inventário de roupas e a marca/estilista de cada, fazendo com que as fotos perdessem todo o seu teor poético e senso de homenagem que poderiam ter.

Cada foto possuía uma nota com o nome da escritora em referência, suas datas de nascimento e morte e o método suicida utilizado, além, é claro, dos créditos de moda pelo que cada modelo estava vestindo (“vestido Issa, óculos Morgenthal Frederics, sapatos Jenni Kayne”).

O real problema não é o conteúdo das fotos, e sim como ele foi abordado. Não se deve crucificar a revista Vice, apenas alertar que pequenos erros como esse cometidos pelos meios midiáticos podem acarretar em consequências trágicas. Se essas fotografias tivessem sido exibidas em exposições de arte, o impacto no público seria outro. Seriam apreciadas como imagens e avaliadas por sua composição e cor, além da poética. Inseridas em outro contexto, o das revistas de moda, a mensagem muda e acontece uma glamourização do suicídio, como sendo uma atitude que, sendo seguida, te faz estar “dentro dos padrões”, de comportamento e de beleza.

Após ter sido tão criticada pelos meios midiáticos, a Vice tirou o ensaio do ar com um pedido de desculpas a todos que se sentiram ofendidos. Foi publicado no site da Jezebel (leia a entrevista completa em inglês aqui http://jezebel.com/model-from-vice-suicide-shoot-speaks-i-was-uncomforta-514323121) uma entrevista com uma das modelos que participou das fotos acerca da opinião dela sobre o impacto causado pelo ensaio. Paige Morgan, 26, retratou a poeta Elise Cowen no momento de sua morte: caída no chão depois de pular de sete andares de altura. Morgan disse que não teve conhecimento da natureza do ensaio até chegar ao local, e que não sabia que as fotos apareceriam na revista sem nenhum tipo de referência ao trabalho das escritoras. Recebeu o convite com a descrição que o tema seria “escritoras que cometeram suicídio”, mas pensando que as fotos ilustrariam matérias sobre a vida delas, e não com foco na morte.

Questionada na entrevista sobre o porquê dela não ter desistido após saber qual seria a real intenção do projeto, Morgan disse que se sentiu desconfortável, mas que, como modelo, não tinha exatamente o direito de questionar nada. “A modelo é a pessoa com o menor poder nessas questões”, ela esclarece. “Infelizmente, eu sabia muito bem que não era meu trabalho perguntar ‘Bom, o que vocês vão fazer com isso?’ ou ‘Vocês vão colocar catalogar roupas nisso? Qual o nome do editorial?’. Se eles fossem me dar uma resposta, certamente seria: caia fora daqui. E a comunidade fashion, mesmo em Nova York, é muito pequena.  E daí eu seria tipo aquela menina ‘Ela é difícil, apareceu um dia e saiu sem completar o trabalho’”. Morgan ainda disse que se sentiu instigada com o fato de ter a vida toda lutado contra depressão, assim como a poeta Elise Cowen, que além disso viveu na mesma vizinhança que ela.  “E acho que pensei, bom, pelo menos eu sou alguém que sabia quem ela era, que entende onde ela estava. E como todos que também já passaram pela depressão sabem, não é algo que se cura verdadeiramente, você tenta controlar o melhor que conseguir mas isso nunca vai embora de verdade. E talvez no futuro, eu ainda possa ter paz com isso. Porque eu e ela provavelmente olhamos para exatamente a mesma vista fora de nossas janelas.”

Ela ainda completa dizendo que se soubesse do foco apenas nas roupas teria recusado o trabalho e que entende o porquê das pessoas terem ficado tão chateadas com o resultado:

O depoimento de Morgan foi algo que comprova: a revista Vice quase acertou em fazer um ensaio interessante tendo a chance de homenagear importantes escritoras e fazer conhecimento delas e de suas obras para seu público-alvo. Mas o foco no consumismo transformou tudo num erro feio. Suicídio e depressão não são glamourosos e devem ser tratados e considerados com a seriedade devastadora que possuem na vida de alguém, e não como uma atitude fashion.

Julia Tetzlaff Rosas
A partir do site LiteraTortura. Leia no original

Abaixo, as fotos publicadas no ensaio. Particularmente acho que elas possuem um potencial artístico enorme, infelizmente não aproveitado:








O SUICÍDIO: UMA DISCUSSÃO FILOSÓFICA

4/18/2013
Imagem por Mikamatto
A "Ilustríssima" (suplemento da 'Folha de S.Paulo') desta semana trouxe uma interessante entrevista com o psiquiatra José Manoel Bertolote, que acaba de lançar um livro sobre a prevenção do suicídio (veja aqui). Não há dúvida de que é preciso tomar medidas para reduzir as mortes autoinfligidas, que, na maioria dos casos, estão associadas a doenças mentais e são uma causa de óbito evitável. Como diz o ditado, "o suicídio é uma solução permanente para um problema temporário".

A crescente medicalização do fenômeno, entretanto, acabou tirando de foco o rico debate filosófico em torno da matéria, que, se não tem lá muita relevância prática, ainda é valioso para a história das ideias.

Na Antiguidade, temos Platão como um ferrenho opositor do suicídio e os estoicos no polo oposto, afirmando que ele sempre é uma opção quando nos vemos impedidos de gozar uma vida pujante.

O cristianismo, mais especificamente santo Agostinho e santo Tomás, porém, faz uma condenação radical da autoquíria, decretando que praticá-la constitui uma ofensa a Deus. Tal posição é majoritária, embora não unânime entre os filósofos mais ou menos até o século 18, quando passa a ser contestada por autores como David Hume e, em seguida, pelos românticos, pelos libertários e por alguns existencialistas.

Mesmo que não se comprem os argumentos pró-suicídio, eles contribuíram para secularizar a questão, diminuindo a carga que pesa contra os que tentam tirar a própria vida, e serviram para revogar medidas legais absurdas que existiam contra eles, como a possibilidade de ser preso e ter os bens confiscados.

É importante seguir com a discussão filosófica, abordando pontos que ainda causam controvérsia, como o direito ao suicídio assistido em caso de doenças incuráveis e até que ponto é legítimo tomar medidas coercitivas para evitar que alguém se mate, mesmo em situações que pareçam menos racionais que a anterior.
A partir da Folha de S.Paulo. Leia no original

A CONCEPÇÃO DO SUICÍDIO - MORRENDO EM MIM MESMO

4/14/2013
Motivos mais comuns são a depressão,
 a esquizofrenia e o uso de substâncias tóxicas
Imagem   por Gustavo Vara
A morte do ator Walmor Chagas aos 82 anos em seu sítio remonta uma discussão intrigante e que sempre causa consternação, o ato de suicídio. O corpo do ator foi encontrado caído na cozinha com um tiro na cabeça pelo caseiro José Arteiro de Almeida. De acordo com relatos de pessoas próximas e familiares, Walmor já estava recluso há muito tempo em seu sítio na cidade de Guaratinguetá por conta de problemas de saúde. O ator sofria com a diabetes e com fortes dores nas pernas, tinha dificuldade de locomoção, problemas de visão e quase não se alimentava. Walmor Chagas estava sozinho em casa e de acordo com a perícia, foi achado pólvora nos dedos do ator, o que fomenta a ideia de suicídio.

Todo este quadro, a saúde debilitada e o isolamento denunciam um estado de abandono e solidão, afinal, o ator não recebia muitas visitas e aos poucos o estado emocional se enfraquecera. Um dos motivos mais comuns a consumar o suicídio é proveniente de depressão, situação na qual a pessoa vai perdendo sua própria identidade, descuidando de si próprio, fica engessado a pensamentos negativos até permanecer apático e melancólico em relação a si, às pessoas e à vida. O segundo maior motivo de suicídio é a esquizofrenia e a terceira o uso de substâncias tóxicas.

O suicídio se divide em algumas categorias, como o suicídio consumado, ou seja, o ato concretizado. Caso não aconteça o suicídio é frustrado, pois, por alguma causa a intenção não foi sustentada pelo indivíduo. A intenção de suicídio é um dano auto-infligido e com o intuito de morrer ou causar fortes lesões. Este comportamento aproxima-se da concepção dos gestos suicidas que são comportamentos também destrutivos e permeados de significados inconscientes. Ainda a estas categorias temos o suicídio coletivo, grupo de pessoas que, geralmente, induzidas por um líder, são conduzidas a concretizar o ato. Caso que ilustra isso aconteceu nos Estados Unidos em 18 de Novembro de 1978, quando Jim Jones, líder de uma seita religiosa promoveu um suicídio coletivo de 918 pessoas, sendo 270 crianças, através da ingestão de veneno.

No caso do ator Walmor Chagas, o suicídio cometido foi racional, ou seja, ele escolheu exatamente como e onde seria sua morte. A pessoa está decidida a acabar com aquilo que está fazendo mal para ela, e para tal, prepara-se internamente para tirar a própria vida.

O psicanalista Sigmund Freud, em uma de suas teorias, descreve a pulsão, uma pressão ou força (carga energética, fator de motricidade) que faz o organismo tender para um objetivo. Embora não seja instinto, a pulsão é uma energia que transita entre o psiquismo e o aspecto somático, força propulsora da personalidade. Existe uma dualidade entre as pulsões, Eros (vida) e Tânatos (morte). Uma pulsão é construtiva e evolucionista, que faz com que a pessoa consiga enaltecer características próprias, ao prazer de si mesmo. Já na pulsão de morte acontece a redução completa das tensões, ou seja, são pulsões autodestrutivas e conduzem a pessoa a um estado anorgânico. Manifestam-se de maneira agressiva e autodestrutiva. No suicídio poderíamos dizer que as pulsões de morte predominam sobre as pulsões de vida.

Somos imersos em nossas próprias incapacidades e temos que lidar com a própria impotência de não saber de tudo. Na vida as respostas não são imediatas, ora buscamos, ora construímos. As perguntas e questionamentos sobre si, o mundo, as pessoas e o sentido da vida se multiplicam e, ao indivíduo, resta administrar estas indagações e dar sentido a idéias e concepções obscuras. A morte desperta curiosidade e até certo fascínio, tanto quanto viver e todos os prazeres atribuídos a esta vida. Mas assim como se escolhe viver, igualmente a morte é uma escolha. A existência é sentida como um castigo divino.

O suicídio é um assunto que não é explorado na sociedade e tampouco na mídia, que deveria ter um papel importante para a compreensão deste fenômeno de massa. O que permeia o suicídio como a depressão, angústia, receios, melhor qualidade de vida não dá ibope. As futilidades, frivolidades e banalizações são mais lucrativas. Um desafio para psicólogos, médicos e psiquiatras que devem se antecipar e prevenir situações de risco e perigo, bem como a sociedade precisa olhar com mais atenção às manifestações, impasses e conflitos da alma.
Breno Rosostolato
Psicólogo clínico, terapeuta sexual e professor da Faculdade Santa Marcelina – FASM
A partir  do Portal Hospitais do Brasil. Leia no  original

DEPRESSÃO : O MAL DO SÉCULO

4/12/2013
Imagem  por DeathByBokeh
Resumo: Pesquisas revelam que cerca de 20% da população mundial tem um ou mais episódios da depressão grave durante a vida, e cresce cada vez mais, estima-se que a depressão ocupará o segundo lugar entre as causas de doenças e incapacidade no mundo no ano de 2020. As mulheres são as principais afetadas pela doença, e a OMS avalia que a depressão ocupa o quarto lugar entre as dez principais caudas de morbidade mundial. Essa doença é visto como um verdadeiro distúrbio mental, altamente debilitante, a ponto de ser considerado por muitos como o “mal do século”. O presente estudo tem como objetivo estudar o transtorno, bem como suas causas, sintomas, e assim propor uma intervenção a fim de minimizar o impacto da mesma no indivíduo   

1 Introdução

A depressão é um grande transtorno moderno no que diz a respeito à saúde mental, é segundo Nedley (In Revista Vida e Saúde, 2009, p. 10) causada por um distresse mental (Distresse: é o estresse prejudicial ou desagradável e estresse: é um estado de ansiedade, medo, preocupação ou agitação com resultados psicológicos negativos e doloridos). Uma definição segundo Cembrowick e Kingham (2003) foi dada por Sir Audrey Lewis nos anos 50, ele diz que as pessoas deprimidas ficam tristes e doentes com sua tristeza.

É o mal que encabeça as consultas psiquiátricas e psicologia clinica. E cresce cada vez mais: estima-se que a depressão ocupará o segundo lugar entre as causas de doenças e incapacidade no mundo no ano de 2020, ficando atrás apenas das doenças cardiovasculares (RIO, apud MELGOSA 2009). 

A depressão afeta todas as faixas etárias, segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS) calcula-se que há mais de cem milhões de pessoas deprimidas no mundo.

Conforme Cembrowick e Kingham (IBIDEM, p. 26 e 27) existem alguns tipos de depressão, tais como:

Primaria e secundária: primária significa que a doença se desenvolveu por si só, secundária é quando a depressão é causada por outra doença.

Depressão neurótica e depressão psicótica: a neurótica significa que não importa o quanto está doente a pessoa está sempre em contato com a realidade, já a psicótica a pessoa perde o contato com a realidade, ou suas crenças podem variar da normalidade do individuo.

Depressão endógena e exógena: essa terminologia é pouco usada, mas endógena refere-se à depressão que vem de dentro, sem uma causa obvia, já a exógena quando a doença aparece em função de um evento estressante, como morte de um ente.

Transtorno afetivo unipolar e bipolar: depressão unipolar significa uma doença depressiva que aconteceu em uma pessoa que experimenta tanto o humor normal como o deprimido. Bipolar por outro lado a pessoa experimenta em diferentes momentos humor normal, deprimido e alto ou alvoroçado.

A Classificação Internacional das Doenças, da Organização Mundial da Saúde, em sua décima revisão, a CID-10, classifica a depressão da seguinte forma:

F32: Episódios Depressivos: O número e a gravidade dos sintomas permitem determinar três graus de um episódio depressivo: leve, moderado ou grave. Os episódios leves e moderados podem ser classificados de acordo com a presença ou ausência de sintomas somáticos. Os episódios depressivos graves são subdivididos de acordo com a presença ou ausência de sintomas psicóticos.

F33: Transtorno Depressivo Recorrente: Transtorno caracterizado pela ocorrência repetida de episódios depressivos na ausência de todo antecedente de episódios independentes de exaltação de humor e de aumento de energia (manias), comporta breves episódios caracterizados por um ligeiro aumento de humor e da atividade (hipomania), sucedendo imediatamente a um episódio depressivo. Essa classificação tem as mesmas subdivisões descritas para o episódio depressivo.

1.1 Sintomas:

Os sintomas da depressão são vários, sendo eles:

Estado de imensa tristeza: Surge o choro e sentimento de desespero, às vezes sem motivo.
Ausência de alegria em qualquer atividade. Sem motivações para nada.

Perda ou ganho de apetite e peso: Não apetite nem mesmo diante de comidas deliciosas. Em alguns casos, o paciente possui excesso de apetite ou aumento de apetite quase todos os dias.

Alterações do sono: A insônia é mais frequente, embora às vezes na depressão há um excesso de sono.

Lentidão ou agitação nos movimentos: Caminha ou fala de maneira vagarosa ou manifesta sensação de inquietação.

Fadiga ou perda de energia: sensação de fraqueza física, com semblante abatido.
Sentimentos negativos para consigo mesmo. Falta de autoconfiança.

Sentimento de culpa: Senso de culpa por coisas sem importância e sensação de fracasso.
Limitações na capacidade mental: lentidão no pensamento, diminuição da atenção e concentração.
Ideias e intenções de suicídio: Pensamento da morte como fuga, podendo planejar, tentar ou até mesmo cometer o suicídio.

1.2 Causas:

Segundo Melgosa (2009) ainda não se sabe ao certo como a depressão é causada, no entanto há muitos componentes como a vulnerabilidade genética, (Se uma pessoa tem depressão, as chances de um parente próximo de ter aumentam em 20%. Nos casos de gêmeos idênticos essa estatística aumenta para 70%); eventos do cotidiano quando ocorrem situações estressantes, como assaltos ou de perda de ente querido; doenças físicas, tais como esclerose múltipla, derrame, hepatite, apnéia do sono, hipertensão, doenças terminais também são determinantes. Assim como algumas drogas como a cortisona, anfetaminas, pílulas anticoncepcionais, quimioterapia, álcool, maconha etc. Estas uma vez instaladas há mecanismos bioquímicos, psicológicos e sociológicos que infamam ou perpetuam a doença.

1.3 O Que Ocorre?

Há algumas pessoas que detestam a solidão, sensação de abandono e infelicidade; dependendo do estado de espírito, pode produzir melancolia e medo. Sentimento de impotência perante as situações e sentimento de perda são as causas mais frequentes e marcantes da depressão. Tudo isso depende da escala de valores que atribuímos às coisas. Se perdermos algo que consideramos essencial ou importante, podemos manifestar ou não a depressão.

No entanto, ainda existem algumas pessoas consideram a depressão “frescura”, mas a verdade é que esses comportamentos de desânimo, fadiga, não é falta de atitude, mas sim um mau funcionamento metal. Segundo CEMBROWICK e KINGHAM (2003), as alterações no sistema límbico (hipotálamo, hipocampo, amígdala, tálamo, giro do cíngulo e os núcleos basais) tem-se mostrado importante, neurocientistas afirmam que se a função do sistema límbico está aumentada resulta em uma inapropriada exaltação de humor ou manias, se sua função está diminuída resulta na depressão, e se ainda suas funções estiverem defeituosas pode resultar numa psicose.

O humor e seus transtornos estão relacionados às funções cerebrais, assim uma pessoa estressada mostra alterações em sua química corporal e cerebral. O hipotálamo e a glândula hipófise controlam a resposta corporal ao estresse, seja aumentando ou diminuindo seus débitos de hormônios cerebrais. O aumento de um dos hormônios, mas especificamente o CRF – fator liberador de corticotrofina, causa uma liberação do hormônio liberador de corticotrofina.

Essa substancia em si estimula a produção de uma substancia que estimula a produção de esteróides e cortisol pela glândula hipófise, esse aumento dos esteróides afeta os neurotransmissores (monoaminas, noradrenalina e serotonina) que após algum tempo causa algumas reações depressivas como falta de apetite, sono, entre outros.

1.4 Prevenção:

Busque suficiente apoio social: Geralmente há pouca frequência da depressão em círculos em que há fortes laços de relacionamento conjugal, familiar, trabalho ou amizades.

Mantenha uma vida ativa: Ocupe-se de tarefas que causem satisfação e que sejam produtivas e edificantes. Pratique esportes ou exercício físico aeróbico.

Pense corretamente: Evite analise negativa das situações.

Olhe para o passado com prudência: o passado pode ser fonte de depressão e também de bem-estar emocional, alegre-se com os tempos e acontecimentos felizes.
1.5 Como Curar a Depressão?

A maioria das doenças depressivas vai melhorar com o tempo, com ou sem tratamento, no entanto algumas formas de tratamento têm o papel muito importante por ajudar a reduzir o desagrado da doença e acelerar a recuperação, tais como: a Farmacologia e a psicoterapia.(CEMBROWICK e KINGHAM, 2003)

 Na maioria dos casos é indicado tratamento farmacológico inicial prescrito por um médico ou psiquiatra, simultâneo de um plano de intervenção psicológica, bem como alguns hábitos cotidianos, como a alimentação, que prepara a pessoa a sair da depressão e evitar seu retorno.

1.5.1 Produtos Psicofarmacos: os Antidepressivos

Os medicamentos antidepressivos são uma eficiente forma de alivio da dor psíquica e tendência ao suicídio, atuando sobre a química cerebral para equilibrar a atividade dos neurotransmissores no cérebro, aliviando os sintomas da depressão e fortalecendo os efeitos da psicoterapia.

A eficácia dos antidepressivos foi comprovada por milhares de ensaios controlados com placebos. No entanto, às vezes é preciso submeter o paciente a muitos tipos de medicamentos até encontrar o mais indicado para os resultados, sendo que os medicamentos antidepressivos podem produzir efeitos secundários de variada intensidade como: problemas na sexualidade, alterações cardiovasculares, sonolência ou insônia, visão turva, nervosismo, prisão de ventre, aumento ou perda de peso e secura na boca, porém hoje em dia os medicamentos mais novos têm sido trabalhados a fim de amenizar os efeitos colaterais.

Os principais tipos de antidepressivos conforme Cembrowick e Kingham (2003, p. 99 e 100)

Antidepressivos tricíclicos (TCAs): são usados também em transtornos fóbicos e obssessivocompulsivo.

São eles: amitriptilina, amoxapina, doxepina, nortriptilina etc.
Inibidores seletivos da recaptação da serotonina (SSRIs): podem causar náuseas e aumentar os sintomas de ansiedade. 

São eles: citalopram, sertralina, paroxetina fluoxetina etc.
Inibidores da monoaminoxidase (IMAOs): são os primeiros que foram desenvolvidos e ainda são muito eficazes.

São eles: fenelzina, moclobemida, tranilcipromina.
E ainda existem os inibidores seletivos da recaptação da noradrenalina (NARIs), os antidepressivos seletivos da noradrenalina e serotonina (NASSAs) e os antagonistas da 5-hidroxitriptamina (5-HT).

1.5.2 Remédios Naturais:

Os psicofarmacos não substituem a necessidade de seguir uma dieta saudável e de abster de qualquer tipo de droga, por agredirem ainda mais o sistema nervoso, bem como a prática de exercícios físicos que tem se mostrado eficaz.

Em geral as pessoas deprimidas tendem a consumir os doces e gorduras saturadas, e estes podem agravar ainda mais o quadro depressivo. Por isso torna-se de suma importância durante o processo de tratamento utilizar-se de alguns alimentos que são benéficos para o processo de restauração.

Conforme Ferrer (2009) os alimentos apropriados para depressão são: Aveia, Gérmem de trigo, Grão-de-bico, Amêndoa nozes, Castanha de caju, Vitaminas B1, B6 e C que atuam diretamente no sistema nervoso estabilizando-o e outros.  Os alimentos que devem ser reduzidos ou eliminados são: Bolos, Chocolates, Açúcar branco, Bebidas estimulantes (café, chá preto, bebidas alcoólicas e outros).

Há estudos que mostram o efeito positivo de alguns remédios fitoterápicos como o hibérnico, erva de são – João e tília.

1.5.3 Psicoterapia:

Os medicamentos antidepressivos aliviam os sintomas da depressão, no entanto não curam a doença. As eliminações dos agentes que causam o estresse e a mudança de atitude e conduta através da ajuda psicoterápica podem contribuir para a cura até o ponto de os medicamentos não serem mais necessários.

Psicoterapia é o tratamento através da fala, existem varias abordagens que trabalham de formas diferentes, mas a que, conforme estudos, trás mais resultados é a cognitivo comportamental, por enfocar um ou dois sintomas, assim os resultados são mais facilmente avaliados (CEMBROWICK E KINGHAM, 2003, p. 116).  Na psicoterapia em geral, a taxa de recuperação após o tratamento é de 65%. A boa terapia deve sem duvidas acelerar o processo de cura.

Conclusão

A depressão é uma doença que afeta toda a vida do individuo, tanto psicologicamente quanto fisicamente, emocionalmente e socialmente. E para o bem, hoje já existem muitas formas eficazes de tratamento, como os fármacos e a terapia, que são essenciais no processo de cura, e é claro um estilo de vida saudável, que tanto pode evitar como ser um agente positivo durante o processo de cura.
 Liz Maria Almeida de Andrade
A partir de Psicologado. Leia no original

REFERÊNCIAS:


CLASSIFICAÇÃO INTENACIONAL DAS DOENÇAS - CID 10, 10ª revisão. Disponível em: . Acesso em: 20 mar. 2012.

CEMBROWICZ, Stefan e KINGHAM, Dorcas. Vencendo a Depressão ­– Coleção “Tudo Sobre...”. São Paulo: Ed. Andrei, 2003.

FERRER, José. Orientações sobre saúde: Receitas que deram certo. Rio de Janeiro: Editora ADOS Ltda., 2009.

MELGOSA, Julián. Mente Positiva: Como Desenvolver um estilo de vida Saudável. São Paulo: Casa Publicadora Brasileira, 2009.

REVISTA VIDA E SAÚDE. Depressão: 9 sintomas de uma das mais comuns e perigosas doenças mentais. Ano 71, n˚12, 2009.

REVISTA VIVER - Mente e Cérebro. HOLLON, Steven D.; THASE, Michael E.; MARKOWITZ, John C.. Tratamento da depressão: Medicação ou Psicoterapia. Ano XIII, n˚146, 2005.

ROGER, Jorge Pamplona. O poder medicinal dos alimentos. São Paulo: Casa Publicadora Brasileira, 2006.

SUICÍDIO : REFLEXÕES

4/11/2013
Era sábado de manhã, eu estava em um hotel fazenda dando conta do calendário de férias escolares, e na véspera tinha me divertido com "Uma coisa supostamente divertida que eu nunca mais vou fazer", ensaio/reportagem de David Foster Wallace sobre sua experiência em um cruzeiro de luxo no Caribe. Me divertindo em termos. Cada vez que ele fazia uma de suas digressões geniais, me flagrava pensando: que raiva desse sujeito. Como assim ele não vai mais escrever essas coisas, nunca mais, com tanto mundo para ser escrito, tanta vida disponível para ser vivida? Que raiva. 

Pois naquele sábado, na varanda que desabava por cima de um jardim impecável, salpicado de flores e cercado por colinas verdes sobrepostas no horizonte, eu já estava lendo outro texto do livro Ficando longe do fato de já estar meio que longe de tudo. Não tinha me detido tanto (ainda) no título do livro, uma frase retirada de outro ensaio sobre uma feira agrícola e que parecia referir-se ao fato de os moradores do meio-oeste rural americano já viverem "meio que Longe o tempo todo". Avançava para o final do livro em outro texto. Lembro de estar degustando o momento, um daqueles em que o tempo escorre devagar o suficiente para se perceber o privilégio de estar atento ao tempo presente. 

Wallace falava sobre a importância de estar atento. Atento e forte, acrescentei caetana e mentalmente. Eu estava lendo "Isto é água", discurso de paraninfo no Kenyon College que depois descobri ser cultuado na internet, com direito a áudio e tudo. Venerar David Foster Wallace, de certa forma, ganha sentido no discurso:

"Não existe isso de não venerar. Todo mundo venera. Nossa única escolha é o que venerar. E se existe uma ótima razão para talvez venerar algum tipo de deus ou coisa espiritual - seja Jesus Cristo ou Alá, YHWH ou uma deusa-mãe wiccan, as Quatro Verdades Nobres ou algum conjunto inviolável de princípios éticos - é que provavelmente todas as outras coisas vão devorar vocês vivos. Quem venerar o dinheiro e os bens materiais, quem buscar neles o sentido da vida, nunca terá o suficiente. Nunca terá a sensação de que tem o suficiente. É a verdade. Quem venerar o próprio corpo, beleza e encanto sexual sempre vai se achar feio, e quando o tempo e a idade começarem a deixar marcas morrerá um milhão de mortes antes de finalmente ser enterrado por alguém. (...) Quem venerar o intelecto, ser visto como inteligente, vai acabar se sentindo burro, uma fraude na iminência de ser desmascarada. E por aí vai.

"Essas formas de venerar são traiçoeiras não por serem malignas ou pecaminosas, mas por serem inconscientes. São configurações padrão. É o tipo de veneração pelo qual nos deixamos levar gradualmente, dia após dia, e que nos torna cada vez seletivos em relação ao que vemos e a como atribuímos valor às coisas, sem jamais termos plena consciência do que é isso que estamos fazendo. E o suposto 'mundo real' nunca desencorajará vocês de operarem nas configurações padrão, porque o suposto 'mundo real' dos homens, do dinheiro e do poder avança tranquilamente movido pelo medo, pelo desprezo, pela frustração, pela ânsia e pela veneração do ego."

Eu estava dialogando com Wallace, claro. Não sou de venerar (pelo menos de forma consciente), tenho dificuldade em manter ídolos e me sentia atraída pela possibilidade de tê-lo como objeto de veneração, para ajudar na minha luta contra a configuração padrão. Caramba, como me identifiquei com aquilo. Só que eu chamava de luta contra os lugares comuns e as verdades cristalizadas. Sim, é preciso questionar tudo, o tempo todo, estar atento e forte... Mas a vigilância cansa. "Atento e forte" pode ter se tornado um clichê? O fato de eu grudar uma palavra na outra me acendeu uma luz interna amarela. Mas Wallace diz para mim que muitos clichês são também grandes verdades. Por exemplo: o velho clichê segundo o qual "a mente é uma excelente empregada, mas uma péssima patroa": 

"Esse clichê, que como tantos outros é tolo e banal na superfície, no fundo expressa uma grande e terrível verdade. Não há um pingo de coincidência no fato de que a maioria dos adultos que cometem suicídio com armas de fogo faz isso com um tiro na... cabeça. E a verdade é que muitos suicidas já estão mortos muito antes de puxar o gatilho."

Para tudo. Não, eu não tinha parado para pensar na forma como Wallace se suicidou em 2008, enforcado, três anos, três meses e vinte dias depois deste discurso. É que havia chegado, finalmente, o jornal de sábado. Como eu o solicitara na portaria, o funcionário apressado acabara de me entregá-lo. Na capa, a morte do ator Walmor Chagas. 

*  *  *
O problema do suicídio é não ter parte 2 - pelo menos é nisso que acredito. Então o escritor David Foster Wallace, o ator Walmor Chagas e o programador Aaron Swartz não nos darão explicações para suas decisões. Como o suicídio é um tabu dentro de outro maior ainda, que é a morte (há quem defenda que a morte tomou o lugar do sexo no ranking de tabus da modernidade), simplesmente temos dificuldades em pensar nele. No mínimo, não estamos acostumados. 

Por muito tempo o suicídio sequer era noticiado na imprensa brasileira, e o primeiro a falar disso, se não me engano, foi o jornalista Arthur Dapieve, que escreveu o livro Morreu na contramão - o suicídio como notícia. Eu mesma, em redação de jornal, lembro de ter ouvido: não "damos" suicídios. Tabus são assim, e quem os estuda sabe como essas frases lacônicas silenciam tudo. 

Mas os tempos já são outros, são os tempos da internet, e o fato é que os três suicídios foram considerados notícia, receberam ampla cobertura, e, para mim, de certa forma coincidiram: soube das mortes de Walmor e de Aaron na época em que estava lendo Wallace. Ou melhor, enquanto estava descobrindo o escritor americano e percebendo em sua escrita uma espécie de compromisso com o futuro, uma pregação sobre a importância de se estar atento a tudo - principalmente a si próprio - para poder fazer escolhas verdadeiras.

Tradutor do primeiro romance de Wallace que será lançado no Brasil, Caetano Galindo reconheceu que pode ser "inescapável" entender o escritor a partir de sua depressão e seu suicídio. (Ah, sim: como tantos suicídios, o de Wallace costuma ser "explicado" pela convivência com a depressão e pelas dificuldades com a medicação.) Em entrevista a Francisco Quinteiro Pires, Galindo parece lamentar: "Ficou a sombra de que a morte dele representava uma confissão do fracasso da missão enorme que tinha se imposto".

Ao se matar, Wallace não teve oportunidade, por exemplo, de escrever algo sobre o fenômeno Facebook - embora parecesse bastante visionário sobre os impactos das tecnologias no comportamento humano. Depois de ler seus ensaios, me flagrei tentando reproduzir o seu olhar para pensar as redes sociais. Ou melhor, em como 'nós' agimos nas redes sociais (e ele colocaria a palavra 'nós' em destaque). Por que andamos tão pouco questionadores sobre tanta coisa? Será que os leitores de Wallace, após a sua morte, consideraram a missão pesada demais? 

Impossível não relacionar isso tudo, também, ao suicídio de Aaron Swartz, um dos criadores do RSS e fundadores do Reddit. Como Wallace, o programador americano tinha uma mente privilegiada, talento de sobra e a mania de questionar tudo sobre todos. Seu questionamento incessante o levou a ser um ativista na internet e usar a própria genialidade como hacker, em prol do livre acesso ao conhecimento. Parecia ter uma missão, uma missão que talvez tenha pesado demais - estava sendo pressionado e processado. Enforcou-se, aos 26 anos. 

Um diagnóstico de depressão também acompanhava Aaron, e realmente seria muito confortável para todos nós que suicídios sempre tivessem como "explicação" uma patologia. De preferência uma patologia com cura possível: fulano se matou porque não tomou o remédio. 

Como diria Wallace, individualmente somos serzinhos egoístas, que transpomos para nosso universo pessoal toda e qualquer experiência alheia. É o nosso ponto de vista e são os nossos interesses que imperam, porque não conseguimos de fato 'estar' no lugar do outro. E, para nosso conforto pessoal, buscar explicações fáceis para as mortes dos outros nos desobriga a pensar em nossa própria morte. Ou, mais provavelmente, nos desobriga a pensar em nossa própria existência.

E foi por esse motivo que, numa manhã de sábado, uma semana depois do suicídio de Aaron, quando eu estava lendo Wallace e soube da morte de Walmor Chagas, parei tudo para buscar uma explicação. Walmor era um ator genial. O obituário exaltava isso, e mesmo quem não teve oportunidade de constatá-lo pessoalmente podia percebê-lo por sua postura e conduta (vale a pena rever sua entrevista ao programa Starte, da Globo News). Sabe qual foi o nome da última peça que ele encenou, em 2005? Um homem indignado, de sua autoria.

Se pensar na morte como opção é difícil porque também temos que pensar na vida como uma opção, e no que devemos fazer com toda uma existência sem sentido, naturalmente a explicação fácil nos conforta. Walmor, eu leria, estava deprimido. Isolado há anos em um sítio, reclamava das limitações físicas da velhice. A pior delas, a dificuldade para ler - uma de suas últimas paixões - teria sido a gota d'água. Então era isso: Walmor Chagas se matara com um tiro de revólver calibre 38 na cabeça porque estava cego. E ainda dava para subtrair uma mensagem edificante de seu ato final: é mesmo terrível não poder ler, e viva a literatura.

Mas não era possível ignorar que havia, já em 2005, um homem indignado com a mediocridade reinante, um homem que não estava cego e tinha sete anos a menos que os 82 com que se mataria. Como já deve ter ficado claro, eu resistia em pensar que pessoas admiráveis só se mataram por uma contingência física ou um desequilíbrio químico no cérebro. Só que, ao rejeitar a justificativa da depressão para os suicídios, eu acabava caindo numa outra tentativa de "explicar a morte": eram pessoas geniais, e com uma consciência exacerbada, que queriam mas não conseguiam mudar o mundo. 

No fundo, tratava-se apenas de uma hipótese formulada por um serzinho egoísta, ávido por justificar as inquietações de sua própria existência... Pelo menos o suicídio está deixando de ser tabu, e estamos falando e pensando nele ele aqui, agora.
Marta Barcellos 
A partir do Digestivo Cultural. Leia no original
 
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